O deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, disse a correligionários em reunião interna do PT faltar à gestão Lula 3 “comando político mais estrategicamente centralizado” na relação com a sociedade, Congresso e estados e municípios.
O petista falou durante o encontro virtual “Conjuntura atual e relação com o Congresso” promovido pela CNB (Construindo um Novo Brasil), principal corrente interna do partido, na terça-feira (11).
Na conversa, o deputado também afirmou que fazer a articulação política do governo na Câmara lhe tira o sono.
“Tenho que me relacionar com toda a Casa, não é uma tarefa fácil, é um negócio muito doloroso. Tem dia que eu não consigo dormir por conta da tensão, da faca no pescoço e tudo mais que muitas vezes acontece nos bastidores aqui dentro [do Congresso] para a gente apoiar, aprovar as matérias de interesse do governo”, disse.
A Folha teve acesso a trechos da reunião que foi gravada e reuniu dezenas de militantes do partido.
Guimarães também afirmou que existe um “não comprometimento” dos partidos que integram a base de apoio a Lula no Legislativo, o que tem levado o Executivo a uma série de reveses nas últimas semanas.
A esquerda tem tamanho minoritário na Câmara e Senado. Por isso, o petista buscou formar sua base de apoio distribuindo ministérios a partidos de centro e de direita, em um primeiro momento para União Brasil, PSD e MDB —cada uma das legendas têm três representantes na Esplanada.
No ano passado, fez uma reforma ministerial, abrindo espaço no primeiro escalão para o PP e o Republicanos, numa tentativa de consolidar sua base na Câmara.
“Esse não comprometimento desses partidos que estão na aliança para garantir a governabilidade, eles terminam dando, como se diz lá no Nordeste, um no prego e um na ferradura. Porque não somam conosco nessas matérias, como por exemplo, os vetos do presidente Lula, na questão das saidinhas e das fake news. É portanto um drama aqui dentro”, afirmou Guimarães.
O deputado voltou a defender trocas no governo e disse que lhe foi chamada a atenção por ter tratado disso publicamente em entrevistas. À Folha, em maio, ele defendeu uma renovação na Esplanada dos Ministérios e uma chacoalhada geral no PT para o enfrentamento do bolsonarismo nas redes sociais e nas ruas.
“Tem que dar uma chacoalhada. O risco de acomodação do governo é muito grande. O nível de entregas ainda é muito grande para algumas áreas, mas muito pouco para outras. Tem que haver um ‘rearrumamento’ da casa”, disse Guimarães aos militantes do partido na reunião.
Segundo disse, “falta ao governo um comando político mais estrategicamente centralizado, que possa dirigir a relação com a sociedade, a relação com o Congresso e a relação com os entes federados”.
“Nós já entregamos muita coisa e nem sempre aquilo que nós entregamos faz com que a popularidade do presidente aumente. Muito pelo contrário, teve queda nos últimos meses. Essa chacoalhada eu acho que era bom. Mas isso quem faz é o presidente”, disse.
A articulação política de Lula no Congresso é criticada por parlamentares desde o ano passado. Ela é comandada formalmente por Alexandre Padilha (PT), ministro das Relações Institucionais e desafeto do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Além dele, formam o time o líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), o líder no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), e Guimarães.
Após sessão do Congresso no mês passado que impôs derrotas ao governo, o presidente determinou que iria participar de reuniões semanais da articulação política numa tentativa de azeitar a relação com o Legislativo. Pouco mais de uma semana após inaugurar esse novo modelo, no entanto, o governo acumula erros em série.
Ainda na reunião interna do PT, Guimarães disse que mais cedo ou mais tarde o Executivo deverá fazer mudanças, “porque elas são necessárias” e disse que o governo precisa estar bem para preparar a reeleição de Lula em 2026.
“A partir da eleição municipal, nós temos mais dois anos e temos que preparar a reeleição do Lula. E o governo tem que estar bem. Tem duas mudanças que eu penso que são necessárias fazer no governo. É a mudança do ponto de vista do centro político, que precisa ter, e também uma mudança profunda na linha da comunicação.”
A comunicação do Executivo também é considerado um ponto de atenção e alvo frequente de críticas —até mesmo de governistas. A Secom (Secretaria de Comunicação Social) da Presidência é hoje comandada interinamente por Laércio Portela, que substitui o titular do cargo, Paulo Pimenta (PT-RS), que exerce a função de ministro extraordinário da reconstrução do Rio Grande do Sul.
Procurado pela reportagem, o líder do governo na Câmara afirma que a reunião da CNB era um debate interno, de balanço e de reorganização da tendência. Ele diz que sua fala foi feita a partir da análise de “vários dirigentes cobrando maior interação do governo com os estados e com o PT”.
“Afirmei que é necessário reconstruir a governabilidade, afinar a governabilidade, porque é difícil aqui. Nem todos que estão participando do governo, apoiam integralmente o governo. É necessário o governo ter centralidade política nas ações. O governo precisa se comunicar melhor frente a tudo que entrega e à pouca incidência ao nível de aceitação popular”, disse.
Também disse que não falou sobre pessoas, mas “da necessidade de fazer ajustes na base e na relação do governo com os estados, com todos os entes federados”.